A experiência de Elismarcia Tosta Aguiar Rossi com o Projeto ‘Graffiti #PraCegoVer’
Aos 6 anos, Elismarcia Tosta Aguiar Rossi foi diagnosticada com diabetes mellitus tipo 1. Aos 21, perdeu a visão devido ao descontrole da glicemia. Esse evento transformou sua vida e a colocou diante de desafios diários, mas nunca a impediu de sonhar e buscar seus objetivos. Hoje, aos 28 anos, moradora de Rondonópolis (MT), ela cursa jornalismo e encontrou na comunicação e na escrita uma maneira de se expressar e transformar o mundo ao seu redor.
Desde os 14 anos, Elismarcia se encantou pelo jornalismo ao assistir ao Jornal Nacional (TV Globo). O desejo de ser apresentadora de TV a motivou a seguir essa carreira. “Gosto de escrever, sou muito curiosa e sempre busco aprender coisas novas”, conta. Mas, como estudante cega, sua trajetória acadêmica foi marcada por desafios, desde a falta de acessibilidade nos materiais didáticos até a resistência de colegas e professores para incluí-la de maneira efetiva no ambiente universitário.
“Os professores não estavam preparados para me receber. Tive que buscar apoio no Centro de Reabilitação Louis Braile para ter acesso aos conteúdos”, relata.
O encontro com a arte acessível
Mesmo com essas barreiras, Elismarcia encontrou forças para seguir e teve uma experiência transformadora ao conhecer o projeto Graffiti Pra Cego Ver. O projeto foi apresentado a ela pela professora e jornalista Lília Martins, que a convidou para uma entrevista no Instituto Claro. A iniciativa visa tornar a arte acessível para pessoas com deficiência visual, permitindo que elas “vejam” as obras por meio do toque.
“Quando soube do projeto, fiquei feliz e curiosa para saber como era sentir a arte de uma maneira diferente”, explica Elismarcia. “Vivemos em um mundo extremamente visual, e perceber que a arte pode ser acessível a todos é maravilhoso.”
A proposta foi idealizada por Ricardo e Maurício, que dedicaram três anos ao desenvolvimento da iniciativa e buscaram parcerias para torná-la realidade.
A emoção ao sentir a arte
O momento mais impactante da experiência, segundo Elismarcia, foi quando tocou em uma obra que representava o rosto de uma mulher.
“Ao sentir a boca, os olhos e a orelha em Braille, visualizei através do toque o que uma pessoa sem deficiência visual enxerga. Foi uma experiência emocionante e transformadora”, relata.
Além disso, Elismarcia teve experiências distintas com acessibilidade em exposições culturais. No Museu do Ipiranga, conseguiu sentir as imagens devido ao alto relevo das representações, como um soldado segurando a espada, o braço e até uma chaleira, permitindo que entendesse a cena sem necessidade de Braille. No entanto, em uma exposição sobre Alice no País das Maravilhas em um shopping, percebeu uma grande falha na acessibilidade. “Nos informaram que havia como disponibilizar uma pessoa dedicada à acessibilidade para nos guiar na experiência, mas não foi eficaz, porque não conseguimos sentir realmente a exposição. Isso dificultou muito a imersão, mostrando que ainda há um longo caminho para garantir inclusão em todos os espaços culturais”, reflete.
Acessibilidade cultural: Um caminho ainda longo
Elismarcia observa que, quando se trata de acessibilidade, São Paulo está um pouco mais à frente do que sua cidade natal.
“Aqui algumas coisas, como a arte, são acessíveis. Na minha cidade, não existe isso. Eu nem sabia que existia teatro acessível. Descobri através de um link de um grupo que participo em São Paulo. Vi postarem sobre o teatro acessível e fiquei impressionada, porque nunca tinha ouvido falar nisso antes”, conta.
Ela sempre teve vontade de conhecer esse tipo de iniciativa, pois sua curiosidade é grande.
“Na minha cidade, que tem 250 mil habitantes, nunca se falou em teatro acessível, arte acessível. São Paulo é um lugar com muitos recursos que poderiam ser investidos na inclusão, mas poucos realmente abraçam essa causa e se dedicam a torná-la realidade”, desabafa.
Para ela, esse tipo de iniciativa amplia o acesso à cultura e promove um passo importante para a inclusão.
“Nunca tive a possibilidade de conhecer outro produto cultural em Braille. Essa experiência me fez enxergar que há muitas formas de tornar não apenas a arte, mas tudo acessível. Basta que as pessoas queiram e busquem soluções para isso.”
Projetos como o Graffiti Pra Cego Ver são fundamentais para sensibilizar a sociedade sobre a importância da acessibilidade e da inclusão.
“A cultura deve ser para todos, e essas iniciativas ajudam a criar empatia e compreensão. A acessibilidade atitudinal é um fator essencial para que as pessoas com deficiência visual possam ter igualdade de oportunidades”, destaca.
Reflexão e perspectiva
Hoje, Elismarcia segue firme em sua trajetória no jornalismo e sente orgulho de poder compartilhar sua experiência, ajudando a abrir caminhos para que a acessibilidade seja cada vez mais uma realidade concreta. “Espero que minha história inspire outras pessoas e que mais iniciativas como essa sejam desenvolvidas para tornar o mundo mais inclusivo para todos.”
Como jornalista e também pessoa com deficiência, histórias como a da Elismarcia me mostram o quanto a acessibilidade é essencial e ainda precisa avançar. A arte, a comunicação e a educação devem ser para todos. Que projetos como Graffiti Pra Cego Ver sirvam de inspiração para que mais iniciativas inclusivas se tornem realidade, garantindo que ninguém fique de fora do direito de sentir, aprender e vivenciar o mundo plenamente.